Foda! é lançado


     

“25 anos sem lançar um disco/25 anos pra chegar e te dizer/Que se eu tivesse lançado  um disco/Esse disco seria” Foda!, pois entre obviedades positivas e negativas, é foda lançar o primeiro cd da vida só agora aos 25 anos, embora eu tenha uma banda autoral há bastante tempo (vide Doce de Sal), venha de uma família de músico também, o que poderia ter colaborado para que tivesse lançado músicas antes, mas não, porém me conforta de algum modo saber que o Di Melo lançou seu segundo álbum 40 anos após o primeiro, tem ainda aquilo que vi Cláudia Roquette-Pinto dizer: “não publicar poesia antes dos 25”. São exemplos que mostram a dificuldade em produzir qualquer tipo de arte e a consciência ao fazê-lo.

     Tal qual a cicatriz da vacina BCG ficou nos braços de nossos parentes mais velhos, a música marcará meu perfil diante da vida. A Arte é um senhor de terras e gado com um ferro em brasa que nos deixa a queimadura da música na pele. É romântico isso tudo, eu sei, é romântico como é egoísta e de egoismo eu entendo. Dito isso, foi foda gravar os instrumentos todos de harmonia sozinho, criar os arranjos de sintetizadores e teclados em casa num teclado tão antigo que metade da escala aguda ou tinha as teclas quebradas ou estavam falhando.

     Foi foda me desfazer de duas guitarras que eu tinha junto com pedais, set de pedais e instrumentos que eu vinha juntando desde os 18 anos, na verdade isso foi o de menos já que o dinheiro que consegui vendendo esse material foi todo para custear a gravação do cd, ainda que tenha diminuído as possibilidades de explorar timbres e sonoridades nas músicas. Mas é aí que entra a intuição, sinceridade e tentar o melhor com seu próprio limite. Eu tentei.

     Foram foda as chuvas que peguei quando saía do estúdio já tarde da noite para ir pra casa e o perigo que corri na parada deserta de um bairro longe da área onde moro, tendo de deixar minha guitarra remanescente no estúdio durante todo processo de gravação pra não tá com ela pra cima e pra baixo correndo risco de perdê-la num assalto. Foda também foram as tardes de sol escaldante indo pro estúdio, muitas vezes sem almoçar, direto do trabalho até lá. Pra quem não sabe, o disco começou a ser gravado no período conhecido em Teresina como B R O BRÓ, com início em setembro no qual as temperaturas alcançam fácil 42 graus ou mais, parece besteira e eu até rio lembrando de meu irmão dizer que as células de nosso corpo começam a se desintegrar quando o ambiente atinge temperatura de 40 graus. A própria luz solar em excesso provoca dor de cabeça, irrita os olhos, a pele, a possibilidade de um avc também existe, entre outras coisas saudáveis de um dia em The como pegar quatro ônibus, dois pra ir, dois pra voltar do estúdio. Isso tudo pode ser resumido em um único verso que tem numa música do disco: “nunca entregar os pontos”, “nunca entregar os pontos”.

      Foda também foi a parte em que eu trabalhei toda semana nas sextas à noite acompanhando e contando couvert para uma banda aqui da cidade e tendo de explicar para pessoas que saem para curtir, dançar e se divertir ao som da banda e ao final da noite não querem simplesmente pagar o couvert, que é a parte do dinheiro que vai gerar o pagamento da banda ao final do show. Acho que não custa nada se você sabe que a casa cobra esse serviço, se você curte o som da banda, se você tem um mínimo de respeito pela banda, você valorizar o trabalho dos músicos pagando o bendito couvert. Outra parte foda nessa história é que muitas vezes os donos de casas de shows não colaboram e não querem repassar  à banda todo o couvert apurado (eu sei, haja couvert num parágrafo só, fodac). É um trampo muito ingrato e injusto às vezes ser músico da noite e esse é um ponto que gera bastante discussão entre a classe e desunião também, não há uma regra sobre valores etc. A parte em que eu acompanhei a banda fazendo essa contagem, para que a banda não fosse enrolada pelos donos de casas de shows, clientes espertos, foi para também juntar grana para as gravações.

     E sim, foi essencialmente foda meu irmão Marciano Calixto ter gravado as baterias dessas músicas, principalmente as que misturam muitos ritmos como as faixas “Agarrado à Minha Frustração”, “Marcha-Ranço”, “Pathos” e até “Sobre Meninas e Porcos” com aquela bateria trôpega, que particularmente eu curti muito. Não fosse ele não sei se haveria esse disco, assim como se não fosse a Eryka Alcântara, a faixa três não teria entrado para o cd. Aos dois, muito obrigado!

     As participações do Ronnyel Seed, do Heitor Matos, Joniel Santos, João Pedro e do Agostinho Torres, que me deu mais trabalho pra levar pro estúdio, foram fodas demais, não teria conseguido resultado melhor se tivesse gravado “Núcleos de um Romance Engavetado” sozinho.

     O modo como o Breno Andrade e eu pensamos a foto de capa também foi foda e engraçada, porque ali na imagem é um muro que fica perto da casa onde ele morava, ou seja, ele teve que voltar lá no antigo bairro dele pra fazer o registro e editar um pouco já que a pichação completa é essa: É FODA! com um sharp em cima, daí ele tirou o “é” e o desenho que eu pedi.
  
     Não era intenção que esse texto virasse um jornal, mas eu precisava mesmo falar dessas experiências que marcaram as gravações e muito mais a mim, a quem interessa não sei, mas aqui está. Tudo que eu acredito que deva fazer estou fazendo, assim foi com meu livro de poesias “Reminiscências do caseiro Genival” publicado em 2015, assim está sendo com esse disco, assim espero e desejo que seja com todos vocês que, por ventura, estejam lendo isso até aqui, pois quem diria, eu, preto, pobre, piauiense do bairro Renascença II de Teresina lançando meu primeiro disco. Um disco foda.


Nada tem sido fácil tampouco impossível!

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